Festival de Brasília – balanço e premiação

O 44º Festival de Brasília terminou na última terça-feira com a consagração de Hoje, novo longa de Tata Amaral. Longe de questionar os méritos do filme, premiado em seis categorias principais, a decisão do júri reforça a guinada do evento, que este ano se voltou mais à questões de mercado do que de linguagem ou inovação. Até então, Brasília era conhecida como arena propícia para repercutir o cinema de risco, que ultrapassa fronteiras. Agora investe R$ 250 mil (prêmio principal) em uma produção de qualidade técnica, certo apuro de linguagem, mas acima de tudo, conservadora.

O mesmo vale para Meu país, de André Ristum, que rendeu quatro prêmios, entre eles o de melhor ator para Rodrigo Santoro. Tanto ele quanto Denise Fraga, em Hoje, estão ótimos em seus papéis, o que não ameniza a conclusão de que a nova fórmula de Brasília é brindar o público com rostos conhecidos. No reino dos curtas, vale o mesmo para o paulista L, produção competente mas inofensiva, se comparado com o paranaense Ovos de dinossauro na sala de estar.

As sessões lotadas, com gente sentada nas escadas em todas as noites no Cine Brasília é a prova disso. No entanto, a temida plateia crítica que fez a fama do festival aplaudiu todos os filmes de forma irrestrita. Vaias, só para a ministra Ana de Holanda (na abertura) e à defesa do não-ineditismo na mostra competitiva. Se as noites foram de cinema lotado, no expediente diurno predominaram nos seminários discursos a favor de um cinema comercialmente viável, “de resultado”.

Os nove dias de programação foram permeados por elogios e pedidos de aplausos para líderes do PT, da presidente Dilma a Lula, e para o ex-ministro José Dirceu, sempre ressaltando que a maior novidade do ano são “as exibições descentralizadas em cidades-satélites”. Tudo isso reduz a dimensão de um festival em que a discussão política costumava ser bem mais ampla do que a dos interesses partidários.

Nesse contexto, não impressiona que As hiper mulheres, de Leonardo Sette, Carlos Fausto e Takumã Kuikuro, e O homem que não dormia, de Edgard Navarro, filmes com a antiga “cara” de Brasília, não tenham recebido o merecido reconhecimento. Estranho é perceber boa parte da crítica alinhada às decisões do júri oficial.

Premiação

Longa-metragem

Filme: Hoje, de Tata Amaral
Direção: André Ristum (Meu país)
Ator: Rodrigo Santoro (Meu país)
Atriz: Denise Fraga (Hoje)
Ator coadjuvante: Ramon Vane (O homem que não dormia)
Atriz coadjuvante: Gilda Nomacce (Trabalhar cansa)
Roteiro: Jean-Claude Bernardet, Rubens Rewald e Filipe Sholl (Hoje)
Fotografia: Jacob Solitrenick (Hoje)
Direção de arte: Vera Hamburger (Hoje)
Trilha sonora: Patrick de Jongh (Meu País)
Melhor som: Mahajugi Kuikuro, Munai Kuikuro e Takumã Kuikuro (As Hiper Mulheres)
Montagem: Paulo Sacramento (Meu país)

Júri popular | melhor filme: Meu país, de André Ristum
Júri da crítica | melhor filme: Hoje, de Tata Amaral

Curta-metragem

Filme: L, de Thaís Fujinaga
Direção: Thaís Fujinaga (L)
Ator: Horácio Camandulle (De lá pra cá)
Atriz: Eloína Duvoisin (A Fábrica)
Roteiro: Ali Muritiba (A fábrica)
Fotografia: André Miranda (Imperfeito)
Direção de arte: Raquel Rocha (Premonição)
Trilha sonora: Ilya São Paulo (Ser tão cinzento)
Som: Kiko Ferraz (De lá pra cá)
Montagem: Wallacee Nogueira e Henrique Dantas (Ser tão cinzento)

Júri popular | melhor curta: A fábrica, de Aly Muritiba
Júri da crítica | melhor curta: L, de Thaís Fujinaga
Prêmio Aquisição Canal Brasil: Ser tão cinzento, de Henrique Dantas

Curta de animação

Júri popular: Rái sossaith, de Thomate
Júri oficial: Céu, inferno e outras partes do corpo, de Rodrigo John

(Diario de Pernambuco, 05/10/2011)

Brasília, noite 4 – Armadilhas da memória

O primeiro longa inédito do 44º Festival de Brasília foi muito bem recebido. Inspiradíssimo na linguagem teatral, Hoje desponta na competição como um dos favoritos aos Candangos. Um deles, o de melhor atriz, deve ir para Denise Fraga, em papel dramático pouco usual para atriz marcada pela comédia. Em 1996, a diretora Tata Amaral já havia arrebatado Brasília com o longa de estreia, Um céu de estrelas, que tem alguns pontos em comum com este filme, como a reclusão de um casal em um único ambiente, o apartamento. No entanto, a força de Hoje está na maneira em que aborda os anos de chumbo da ditadura brasileira, através de suas consequências na psiqué de ex-militante.

Para realizar Hoje, Tata convocou antigos colaboradores, como o roteirista (e crítico) Jean-Claude Bernardet, o diretor de fotografia Jacob Solitrenick e a montadora Idê Lacerda. Assim como Um céu de estrelas, a história adapta um romance de Fernando Bonassi, Prova contrária. Bernadet disse que seu método foi o mesmo: não ler o livro, mas deixar que a diretora o contasse: “quis descobrir o que ela vê no texto. Ali se formaram os alicerces, como a ideia de se reduzir ao apartamento”.

O “hoje” do filme se passa em 1998. Vera (Denise) acaba de comprar um apartamento e, enquanto recebe a mudança, se surpreende com a volta do companheiro desaparecido nos anos 1970, vivido pelo uruguaio César Troncoso. A paranoia logo se instala e ela o esconde dos funcionários da transportadora, da síndica indiscreta, deixa janelas semicerradas. Na penumbra, a memória se mistura à arquitetura.

Apesar de algumas incoerências “de época” (em 1998 não havia celulares com ringtones e encanadores 24h na internet) e alguma descontinuidade (perdoável, já que o real se mistura à memória), o filme convence pela atuação e um incrível trabalho de luz. Para representar o trauma da personagem, portas e paredes são banhados em imagens artificiais, projetadas nos próprios atores, como em outro filme recente que trata da ditadura, Uma longa viagem, de Lúcia Murat. E a fotografia final, que representa a liberdade atingida pela personagem, é uma das mais lindas do cinema nacional. Hoje é dividido em “atos” e conforme avança desvela novos territórios da memória de Vera, cujo comportamento levou Denise Fraga a aceitar o papel. “Foi a personagem mais complexa que já fiz”.

É curioso perceber como se fala da necessidade de lembrar dos crimes cometidos durante o militarismo, quando suas vítimas apenas querem, em vão, esquecer. Para a diretora, é preciso debater aquela época de forma mais incisiva. “Não enfrentamos os nossos fantasmas. Ao contrário de outros países, não punimos os nossos torturadores”.

(Diario de Pernambuco, 01/10/2011)

Longe da "perfeição" digital

Uma das melhores atrações do Festival de Brasília, o curta-metragem Céu, inferno e outras partes do corpo, também está na programação do 3º Festival Internacional de Cinema de Animação – Animage 2011, que começa hoje no Recife.

Seu realizador, o gaúcho Rodrigo John não tem do que reclamar. A qualidade de seu trabalho tem sido reconhecida por onde passa – entre os prêmios, foi eleito o melhor curta do Festival de Gramado e do Cine Esquema Novo (júri popular). Em entrevista ao Diario, John fala sobre seu trabalho e seu outro curta que está no Animage, Propriedades de uma poltrona, baseado em conto de Julio Cortázar. Leia mais a seguir.

Entrevista // Rodrigo John: “As melhores coisas feitas em 3D forjam o aspecto do 2D”

Seus filmes têm aspecto artesanal, que passa longe da “perfeição” da técnica digital. Qual é a intenção?
Não sou um paladino da artesania, ou do tosco. Essas escolhas vêm de acordo com o projeto, que encontra a melhor forma no processo. Eu particularmente gosto do feito a mão. Enquanto técnica, o 3D está apenas tirando as fraldas, ainda tem imperfeições. Lembro de quando ele surgiu e grandes estúdios fecharam os departamentos de 2D. Mas o legal está na mistura, acabar com a rigidez matemática. As melhores coisas feitas em 3D forjam o aspecto do 2D.

Nos últimos anos, aumentou o espaço para o experimentalismo?
A animação experimental vem dos primórdios do cinema, mas sempre foi mais marginalizado. Agora fronteiras estão se diluindo, o que permite a essas poéticas trazer para o cinema narrativo convencional um espaço para o caos e desordem. Temos que trabalhar com o imponderável, pois estamos lidando com seres humanos e um planeta que está explodindo. Então, quem quiser investigar, criar, precisa abrir espaço para o erro como laboratório.

O cartunista Fábio Zimbres assina a concepção visual e a direção de arte dos dois curtas. Como rolou essa parceria?
Ele é meu vizinho, amigo de longa data e tenho uma afinidade estética muito forte com o trabalho dele. Pensamos juntos o uso das ferramentas digitais.

Céu, inferno e outras partes do corpo já foi exibido no Cine PE, mas o público do Recife ainda não conhece seu outro curta, Propriedades de uma poltrona. Como um filme de oito minutos pode levar cinco anos para ser feito?
Nem sempre isso acontece. Estávamos produzindo Poltrona quando Céu, inferno… foi aprovado em edital e o fizemos em seis meses. No caso da poltrona, juntamos duas técnicas para criar a cara de uma terceira. O elemento imagético era a luz, a poltrona emana, por isso o processo foi o de produzir cada quadro do filme como fosse uma pintura em vidro, algo muito artesanal, gerado no computador com técnica 3D e rotoscopia e depois sujado no trabalho a mão. Procuramos “estragar” a imagem para torna-la falível.

Céu, inferno… narra com liberdade experimental e certo humor a insuportável dor da separação amorosa. Como surgiu a ideia?
Estava em processo de separação e a história veio de um pesadelo que tive, onde estávamos esquartejados no chão. As imagens me marcaram por alguns dias e como não se evaporaram, elaborei na forma de ficção. No momento era para ser um filme de horror mais experimental, sisudo, utilizando fotos. No processo, a dor foi arrefecendo e fui levando tudo menos a sério, o que me levou a misturar gêneros como o melodrama, comédia e filme de guerra.

(Diario de Pernambuco, 30/09/2011)

Seminários acalorados

Até ontem, os seminários foram a principal atração do 44º Festival de Brasília. Como a programação trouxe filmes já vistos em outros festivais, prevaleceu a discussão e troca de ideias sobre passado, presente e futuro do cinema nacional. Anteontem, o produtor Luiz Carlos Barreto, que desde os anos 1960 atua no ramo e ocupa lugar privilegiado na política para o setor, disse que, quando se fala em cultura no Brasil, ainda se pensa em termos de gorjeta. “O governo dá um milhãozinho aqui, outro ali, mas arte e entretenimento precisam ser vistas como uma questão estratégica, que move a economia mundial”. E aproveitou o microfone aberto para criticar diretores de carreira internacional. “Fernando Meirelles e Walter Salles só pensam nas carreiras, nunca colocam o prestigio a serviço do cinema brasileiro”.

Barretão falou na mesma mesa em que estaria o ex-ministro da Casa Civil, Zé Dirceu, que faltou ao encontro porque não chegou a tempo em Brasília. À noite, Dirceu lançou seu livro de memórias, Tempo de planície. Ontem, compareceu ao seminário ladeado pelo novo coordenador do festival, Nilson Rodrigues. Foi uma aparição relâmpago, inversamente proporcional às acusações de partidarismo (o atual governo do Distrito Federal, que produz o evento, é do PT), quando seu nome foi anunciado, na semana passada. “Comecei minha vida política como cineclubista”, disse. Depois, ressaltou a importância cultural do maio de 68. Sobre a política atual, Dirceu elogiou a presidenta Dilma e disse que as mudanças precisam chegar mais rápido à cultura. “O PAC precisa chegar ao cinema”.

(Diario de Pernambuco, 30/09/2011)

Festival de Brasília, noite 2 – ótima recepção para As Hiper Mulheres

Foi um sucesso a sessão de As hiper mulheres, produção pernambucana/carioca dirigida por Leonardo Sette, Carlos Fausto e Takumã Kuikuko. A sessão, que abriu a mostra competitiva do 44º Festival de Brasília, foi bastante aplaudida pelo público, que por falta de espaço, se espalhou na escadaria do Cine Brasília. Vencedor do prêmio especial do júri e na categoria montagem no último Festival de Gramado, o longa mostra como a tradição do canto é passada de uma geração à outra, em momentos de tanta poesia que geraram aplausos durante a projeção e no final, quando o público marcou com palmas o ritmo da música.

Assinado pela produtora olindense Vídeo nas Aldeias, o filme ganhou elogios do crítico Jean-Claude Bernadet, que estava presente na sessão e no debate, na manhã de ontem. Diferentemente de Gramado, quando somente os irmãos Takumã e Mahajugi, agora os Kuikuro estiveram representados pelas mulheres dententoras do tradicional canto, uma verdadeira comitiva liderada pelo cacique, Afukaká Kuikuro. Um dos diretores, o antropólogo Carlos Fausto diz que, além do reconhecimento estético, a evidência do longa nos festivais pode gerar um trunfo político, pois os Kuikuro lutam pelo reconhecimento de suas aldeias como território místico, ou seja, patrimônio imaterial a ser reconhecido pelo Iphan. Mas no filme não há nenhuma dimensão política. É um belo trabalho que leva ao deleite estético, sensorial, que em novembro poderá ser assistido no Recife, na Janela Internacional de Cinema.

Um pouco antes, a competição de curtas também começou bem, com o gaúcho Céu, inferno e outras partes do corpo, de Rodrigo John, abrindo a mostra de animação, e o baiano Ser tão cinzento, de Henrique Dantas (Filhos de João), a nacional de curtas. Com 25 minutos, o filme destrincha a produção nacional Manhã cinzenta (1967), de Olney São Paulo, uma radical crítica aos regimes totalitários que levou ao cineasta a ser perseguido pela ditadura e, sete anos depois, à morte por câncer. Enquanto o filme de Henrique revisita Manhã cinzenta, membros da sua equipe, entre eles o crítico de José Carlos Avellar, que fez a fotografia, relembra os bastidores da ação militar.

(Diario de Pernambuco, 29/09/2011)

Brasília, noite 1 – mudou tudo, menos a platéia

Com aplausos e vaias, a noite de abertura do 44º Festival de Brasília fez jus à tradição crítica do festival. E nesse sentido, a escolha de Rock Brasília – anos de ouro, documentário sobre a gênese da Legião Urbana, Capital Inicial e Plebe Rude, não poderia ser mais oportuna. Quando seu diretor, Vladimir Carvalho, subiu ao palco com membros das bandas e familiares de Renato Russo, aproveitou para agradecer o apoio que o ex-ministro da cultura, Juca Ferreira, deu ao projeto, o que gerou aplausos. Logo depois, saudou a atual ministra, Ana de Hollanda, presente no evento. Vaias ecoaram ao pelo menos metade do Teatro Nacional. Muito foi mudado no Festival de Brasília, reflexo da troca de gestores na secretaria de cultura do Distrito Federal . Mas o crivo da plateia continua o mesmo.

Como anunciou o mestre de cerimônias, o ator José de Abreu, este ano o Festival de Brasília vai mostrar sua nova cara. Terá sessões promovidas simultaneamente no Cine Brasília e nas cidades satélites. Querem passar a imagem de um festival democrático, que está reagindo à falta de rumo a que estava relegado nos últimos anos. Com uma grandiloquência bizarra (e Xica da Silva como música ambiente), Abreu parecia falar de um picadeiro ou pior, de um palanque político. A presença do ex-ministro José Dirceu, Cacá Diegues e de Luis Carlos Barreto, que participam de seminário sobre novas perspectivas do cinema nacional, foi novamente reforçada como um dos grandes momentos do festival.

Como protesto, o realizador brasiliense Adirley Queirós retirou seu longa A cidade é uma só? da competição Primeiros Filmes. “Fazemos filmes buscando outra perspectiva estética e política (não partidária, e sim política). (…)Transformar o festival em um pastiche, em um moribundo com cara de qualquer coisa. Isso são avanços?”, diz o texto do realizador, enviado para a organização do festival. E estamos apenas no primeiro dia.

Se o cerimonial foi um anticlímax, Rock Brasília teve recepção calorosíssima, com o teatro lotado e gente sentada no chão. O filme faz um retrato afetivo, social e político de uma geração de artistas, filhos de diplomatas e acadêmicos que vieram para a capital federal. Coincide com a época em que Vladimir Carvalho passou a morar na cidade. Ele chama aos músicos de “moçada”, que hoje tem entre 40 e 50 anos. Aos 76, Vladimir certamente os enxerga com e olhos de pai orgulhoso. “Eles são um ensurdecedor exemplo de perseverança”, disse, no palco. No hotel JK, base do festival, o diretor disse em entrevista que na época não chegou a curtir aquelas músicas (ele gosta mais de MPB), mas que se ligou muito a Faroeste caboclo, que para ele, é uma espécie de cordel ou repente. “Se tivesse que eleger uma música era essa”.

Para os pernambucanos, uma boa notícia: seu próximo projeto pode ser um documentário
sobre Cícero Dias. “Tenho admiração antiga pelo Cícero Dias. Ele foi uma figura notável das artes plásticas brasileiras. Por sorte, o filmei no seu ateliê na França e durante uma exposição entrevistei a viúva dele. Me interessa a ligação do surrealismo com o imaginário nordestino”.

(Diario de Pernambuco, 28/09/2011)

Festival de Brasília começa hoje, sob nova direção

Entre rockers dos anos 1980 e políticos do alto escalão, começa hoje o 44º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. O filme de abertura (fora de competição) é o documentário Rock Brasilia – Anos de ouro, de Vladimir Carvalho, com presença de membros dos grupos Plebe Rude, Capital Inicial e parentes de Renato Russo, da Legião Urbana. O documentário não pode concorrer “em casa”, pois o regulamento não permite que filmes premiados em outros festivais (no caso, em Paulínia) participem da competição. Céu, inferno e outras partes do corpo só concorre entre os curtas de animação porque foi premiado em Gramado, após o anuncio da seleção em Brasília.

Mas a criação de uma mostra de animação é a menor das mudanças. O festival chega a 2011 sob nova direção (a cargo de funcionários da secretaria de Cultura do DF), o que tem gerado burburinho entre jornalistas e cineastas. Um dos pontos mais criticados é a inclusão na competição de filmes exibidos em outros festivais. Até o ano passado, Brasília só selecionava filmes inéditos. Este ano, traz os bons Trabalhar cansa (exibido em Cannes e Paulínia), o pernambucano As hiper-mulheres (prêmio especial do júri em Gramado), Meu país (Paulínia), O homem que não dormia (o novo de Edgard Navarro, já exibido em Salvador) e os inéditos Vou rifar meu coração (de Ana Rieper) e Hoje (de Tata Amaral). Eles concorrem ao prêmio máximo de R$ 250 mil, valor idêntico ao concedido em Paulínia. São R$ 425 mil em prêmios.

A presença confirmada dos atores Rodrigo Santoro e Cauã Reymond, do elenco de Meu país, e Denise Fraga, de Hoje, se soma a do ex-ministro José Dirceu e a ministra Ana de Hollanda. Os dois participam do seminário Novas perspectivas para o audiovisual brasileiro, com os cineastas Luiz Carlos Barreto, Roberto Farias, Caca Diegues, Silvio Da-Rin e o exibidor Adhemar de Oliveira, no Hotel JK, o novo QG do festival. Fica a pergunta: qual serão os rumos (e o destino) do evento de cinema mais antigo e um dos mais conceituados do país? Os próximos dias serão decisivos para chegar a uma resposta.

(Diario de Pernambuco, 26/09/2011)

Fôlego do cinema de Pernambuco

A presença de quatro produções pernambucanas inéditas no 43º Festival de Brasília é mais uma prova do bom momento do cinema feito no estado. O evento, que começa na próxima terça-feira e segue até o fim de novembro, costuma aplaudir filmes que refletem o atual momento político e apostam na criatividade narrativa.

Foi assim com os longas Baile perfumado, Amarelo manga, Baixio das bestas e curta-metragens de Camilo Cavalcante e Kleber Mendonça Filho, todos premiados em edições anteriores do festival.

De forma que Vigias, de Marcelo Lordello, Café Aurora, de Pablo Pólo, Acercadacana, de Felipe Peres Calheiros e My way, de Camilo Cavalcante, os novos selecionados para as mostras competitivas deste ano, já entram no páreo com esse background a favor.

Para saber um pouco sobre cada um, o Diario conversou com os realizadores. Confira a seguir.

Zelando pelo sono dos outros – Selecionado pelo Concurso de Roteiros Rucker Vieira, Vigias já foi visto no Recife no formato curta-metragem, em sessão especial promovida pela Fundação Joaquim Nabuco.

O novo corte também converte o documentário para o suporte 35mm, o que deve dar a ele novas cores e luzes. ´A narrativa agora está completa`, diz Marcelo Lordello, um dos realizadores da Trincheira Filmes. ´Ela precisava de mais espaço e tempo para dar conta de todos os personagens`.

Tudo foi feito com R$ 27 mil, impostos descontados. Para viabilizar o transfer para a película, o cineasta Daniel Aragão viajou para Los Angeles, onde o processo é 80% mais barato do que no Brasil.

Como o título sugere, os personagens do filme de Lordello são aqueles que ficam atentos nas portas dos condomínios, zelando pelo sono dos moradores. Seu recorte é mais sensorial do que geográfico.

Durante várias noites do Recife, uma equipe reduzida de sete pessoas visitou profissionais da vigilância da cidade.

´Meia hora de conversa bastava para entender o tipo de abertura e começar a filmar. Não queria um filme de pesquisa de personagem, de vida anterior. Em vez de obedecer algum tipo de dispositivo, me permiti sentir o tempo e observar a relação que se estabelece na hora`, explica Lordello.

Melancholic frevo – Veterano em Brasília, Camilo Cavalcante não adianta muito sobre My way, seu novo curta de ficção.

´É uma pequena parábola sobre a solidão humana. E nada melhor do que o Galo da Madrugada, esse bloco enorme, para encontrar mais um sofrendo na multidão`. Na base de duas câmeras (ele e Camilo Soares), um ator (Silvio Pinto, com quem já trabalhou em O presidente dos Estados Unidos), e muito suor, Cavalcante considera que fez um vídeo experimental, de resultado “bem emocionante”.

´Vai de Vassourinhas a My way, de Frank Sinatra. Se disser mais, perde a graça`, diz o realizador, que convida o público recifense a comparecer no Festival de Vídeo de Pernambuco, que também selecionou o curta.

Vivendo o momento – ´O filme é uma ode ao detalhe`, diz o diretor Pablo Pólo, sobre Café Aurora, seu primeiro projeto 100% autoral. Ele está ansioso para sentir o retorno do público de Brasília. ´É meu momento de realização artística, pois estreei como ator muito novo, depois me afastei e sempre havia uma lacuna para me expressar artisticamente`.

O projeto surgiu anos atrás, a partir da simples ideia de um personagem que se apaixona por outro. Ele é um barista que encara o desafio de se comunicar com ela, uma artista plástica que faz uma escultura e dá um tempo para tomar um café. ´Hoje vivemos conectados, escrevemos no computador enquanto ouvimos música. E no filme é o contrário, eles se desconectam do mundo, se dedicam a curtir o momento. A capacidade de viver as situações de forma profunda é o que une os personagens`.

Tem gente no CanavialAcercadacana é resultado de um processo de aproximação com a agricultora Maria Francisca, que há 40 anos mora em terreno rodeado por plantações de cana na Zona da Mata Norte e está ameaçada de perder a terra para um grupo usineiro.

O engajamento político dos realizadores evidencia a desproporção da disputa pela terra. ´Queremos discutir os lugares de poder e as possibilidades do cinema documentário interagir com isso`, diz o diretor Felipe Calheiros. ´Ao mesmo tempo, há cuidados que podem interessar do ponto de vista da construção da narrativa e montagem`.

A justiça concedeu o direito de usucapião a Dona Francisca, mas a usina recorreu e o caso ainda transcorre nos tribunais. Ela estará em Brasília com os realizadores e juntos divulgarão uma campanha pelo limite da propriedade da terra, uma proposta de emenda constitucional pela reforma agrária.

Brasília costuma receber bem filmes politicamente posicionados. Nesse sentido, Acercadacana tem tudo para se dar bem no festival. ´Tudo faz crer que a discussão vai ser boa. Estamos curiosos para essa sessão`.

Desde o início, o projeto foi bancado pela própria equipe. Para fazer o transfer para a película 35mm, houve aporte de R$ 40 mil da Fundarpe. Após a visibilidade obtida em Brasília, a ideia é começar a produção de um longa sobre o contexto da cultura do etanol.

(Diario de Pernambuco, 21/11/2010)

Pernambucanos faturam prêmios em Brasília

Brasília (DF) – O 42º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro terminou na última terça-feira, com uma cerimônia de premiação que privilegiou o longa paulista É proibido fumar, de Anna Muylaert. O filme foi contemplado em oito categorias: melhor filme, ator (Paulo Miklos), atriz (Glória Pires), atriz coadjuvante (Dani Nefussi), roteiro (Anna Muylaert), direção de arte (Mara Abreu), trilha sonora (Márcio Nigro), montagem (Paulo Sacramento) e o prêmio da crítica. Uma pré-estreia e tanto – a estreia comercial será em 4 de dezembro.

Entre os curta-metragens, Ave Maria ou mãe dos sertanejos, de Camilo Cavalcante, e Recife frio, de Kleber Mendonça Filho, receberam prêmios principais. O primeiro ganhou prêmios de melhor filme, fotografia (Beto Martins) e som (Nicolas Hallet, também premiado pelo trabalho em Azul, de Eric Laurence). Esta é a primeira vez que Cavalcante, duas vezes eleito melhor diretor em Brasília, vence nessa categoria. Já o crítico e programador de filmes Kleber Mendonça se consagra como realizador – apesar de já ter vencido em Brasília com Noite de sexta, manhã de sábado e Vinil verde, ele nunca colecionou tantas estatuetas e prêmios: melhor filme (júri popular), melhor direção, melhor roteiro, Prêmio Aquisição Canal Brasil, Prêmio Saruê, Prêmio Vagalume e prêmio da crítica. Kleber confirmou que em dezembro o Cinema da Fundação fará uma sessão especial com os quatro curtas locais exibidos em Brasília. Diretor de Faço de mim o que quero ao lado de Sérgio Oliveira, Petrônio Lorena disse que artistas do brega que participam do filme serão convidados a fazer uma performance.

Após a cerimônia, Evaldo Mocarzel, eleito melhor diretor pelo longa Quebradeiras, evocou não somente mineiros como pernambucanos como vanguarda do cinema nacional. “Da mesma forma que o documentário mineiro está bombando, Pernambuco continua imbatível na ficção”. Para o ano que vem, ele pretende apresentar o novo filme, São Paulo Cia de Dança, no festival É tudo verdade. Assim como em Quebradeiras, ele investe na estética sensorial e radical que explora imagens de composição rigorosa e trilha de áudio desprovida de palavras. E quer voltar a Brasília com Cuba libre, um “doc gay almodovariano”.

Merecido o destaque para o longa Filhos de João – admirável mundo novo baiano, que recebeu o voto do júri popular, prêmio especial do júri oficial e troféu Vaga-lume, concedido por integrantes do projeto Cinema para Cegos. Com depoimentos generosos de Tom Zé, o filme foi de longe o mais querido do festival. “A todos os filhos de João espalhados por aí, crentes de que podemos fazer algo diferente, porque o mundo está muito chato”, disse o diretor estreante Henrique Dantas. Representando o grupo na noite de terça, Moraes Moreira cantou, declamou poesia e disse que o sonho dos Novos Baianos não acabou. “Ele continua no filmes, nos filhos, nos shows de cada um de nós, através do som dos ‘novos novos’ baianos”, disse o compositor.

* O repórter viajou a convite do festival

(Diario de Pernambuco, 26/11/2009)

Festival de Brasília // Pernambucanos de olho no Candango

A 42ª edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro começa hoje, com a pompa de sediar a primeira exibição pública do filme Lula, o filho do Brasil. Até o dia 24, seis longas e doze curtas-metragens concorrem ao troféu Candango, sinônimo de prestígio para os realizadores.

Afinal, falamos do mais antigo e um dos mais conceituados festivais do país. Quatro novos curtas pernambucanos estreiam no evento: Faço de mim o que quero, de Sérgio Oliveira e Petrônio Lorena, Azul, de Eric Laurence, Recife frio, de Kleber Mendonça Filho e Ave Maria ou mãe dos sertanejos, de Camilo Cavalcante.

Juntos, eles correspondem a um terço dos filmes em competição, clara demonstração da força do cinema feito no estado. Laurence, que concorre pela primeira vez no festival, enxerga na situação favorável mais do que talento de seus realizadores. “É reflexo do apoio e incentivo que o cinema têm recebido em Pernambuco”, diz o cineasta.

Estrelado por Zezita Matos, Magdale Alves e Irandhir Santos, Azul é o terceiro curta de ficção dirigido por Laurence (Entre paredes), que também assume a montagem. Na equipe estão Antonio Luiz Mendes (fotografia), Isabella Cribari (produção executiva), Dantas Suassuna (direção de arte) e Carlinhos Borges (trilha sonora). Inspirado em conto de Luzilá Gonçalves (Uma doce maneira de ir morrendo), o roteiro gira em torno da solidão de uma mulher analfabeta que mora numa casa isolada e todos os dias procura uma amiga que lê a mesma carta, escrita pelo filho.

Se o curta de Laurence estabelece um locus existencial / ficcional (o cenário foi especialmente construído pela produção), Ave Maria ou mãe dos sertanejos, de Camilo Cavalcante, se debruça nas possibilidades da interseção documentário / poesia. O filme utiliza a mesma estrutura de Ave Maria ou mãe dos oprimidos (2003), desta vez aplicada ao universo do Sertão, onde, às 18h, as rádios executam a música Ave Maria sertaneja, de Luiz Gonzaga.


Ave Maria ou mãe dos sertanejos, de Camilo Cavalcante

“Diferente do anterior, que mostrava a quase resignação dos moradores do centro do Recife com Nossa Senhora, entre os sertanejos há uma relação mais íntima”, fala Camilo, duas vezes premiado em Brasília (por História da eternidade e O presidente dos Estados Unidos). Seu novo “filho” conta com fotografia de Beto Martins, som de Nicolas Hallet, edição de Caio Zad e produção de Stella Zimmermann.

Recife frio, do crítico e cineasta Kleber Mendonça Filho (outro ganhador de Candangos por Vinil verde e Noite de sexta, manhã de sábado), parte da suposição de que a capital pernambucana passou por mudanças climáticas que inverteram a temperatura proporcionada pelo sol intenso. O plano inicial era simular um falso documentário, com depoimentos dos cidadãos que mudam hábitos para se adaptar às novas condições que tornaram o Recife, nas palavras do diretor, “um cenário de ficção científica”. Enxuta, a equipe é formada por Kleber, Emilie Lesclaux e Juliano Dornelles.

O universo da música brega é o mote de Faço de mim o que quero, parceria entre Petrônio Lorena (O som da luz e do trovão, 2004) e Sérgio Oliveira (Porcos corpos, 2003). Rodado em locações como a praia de Brasília Teimosa (entre Boa Viagem e o centro do Recife), o filme procura traduzir a cultura mais popular da capital ao acompanhar um carrinho de CDs que propaga o som de compositores do gênero, como o Conde do Brega, não por acaso, um dos personagens.

(Diario de Pernambuco, 17/11/09)

Festival de Brasília divulga selecionados


Fora de competição, Lula, o filho do Brasil, abre o evento

Quatro novos filmes pernambucanos foram selecionados para participar da competição do 42º Festival de Brasília.

Ave Maria ou mãe dos sertanejos, de Camilo Cavalcante, Azul, de Eric Laurence, Faço de mim o que quero, de Sérgio Oliveira e Petrônio Lorena, e Recife frio, de Kleber Mendonça Filho, concorrem na categoria curta-metragem 35 mm.

Dois realizadores já foram premiados em edições anteriores do festival: Camilo Cavalcante, por História da eternidade e O presidente dos Estados Unidos, e Kleber Mendonça, por Noite de sexta, manhã de sábado e Vinil verde. Nos últimos anos, o Festival de Brasília tem selecionado e premiado longas como Baile perfumado, Amarelo manga e Amigos de risco e o curta Décimo segundo, de Leo Lacca.

Este ano, o evento será entre 17 e 24 de novembro. O filme Lula, o filho do Brasil, de Fábio Barreto, abre o evento em sessão especial para convidados com a presença do diretor e os atores Rui Ricardo Diaz e Glória Pires. Antes, no dia 14, o longa será exibido pela primeira vez, em sessão especial no Recife.

A mostra competitiva começa no dia seguinte, com seis outros longas inéditos: A falta que me faz (MG), de Marília Rocha; É proibido fumar (SP), de Anna Muylaert; Filhos de João, admirável mundo novo baiano (BA), de Henrique Dantas; O homem mau dorme bem (DF), de Geraldo Moraes; Perdão mister fiel (DF), de Jorge Oliveira e Quebradeiras (SP), de Evaldo Mocarzel. A mostra de curtas digitais traz 18 produções de quatro estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Bahia.

No encerramento do festival será exibido o filme Brasília, a última Utopia, assinado por Pedro Anísio, Geraldo Moraes, Vladimir Carvalho, Pedro Jorge de Castro, Moacir de Oliveira e Roberto Pires.

(Diario de Pernambuco, 23/10/2009), com alterações

Abertas inscrições para o Festival de Brasília

Estão abertas as inscrições para as mostras competitivas do 42º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. O prazo máximo é 30 de setembro.

Realização da Secretaria de Estado da Cultura do Distrito Federal, o evento será realizado de 17 a 24 de novembro, com R$ 470 mil em prêmios.

A ficha de inscrição e o regulamento estão disponíveis no site da Secretaria de Estado de Cultura do Distrito Federal, e no site do evento.

Além da já tradicional mostra competitiva em 35mm, uma das novidades do é a criação da mostra digital, que substitui a competição em 16mm e que será composta somente por filmes brasileiros de curta metragem, de até 20 minutos, captados em 8mm, 16mm ou em vídeo digital concluídos a partir de outubro de 2008.

A mostra competitiva dos filmes em 35mm será composta por seis longa metragens em 35mm, inéditos no Distrito Federal, preferencialmente inéditos no país e que não tenham obtido o prêmio de melhor filme do júri oficial em festival nacional.

Serão selecionados até doze filmes de curta ou média metragem 35mm, inéditos no Distrito Federal e preferencialmente inéditos no país.

A joia rara de Renata Pinheiro

No próximo dia 22, Superbarroco, de Renata Pinheiro, participa do Festival de Cannes. O curta-metragem será exibido no segundo dia da Quinzena Realizadores, na opinião da autora, a mais instigante mostra do maior e mais respeitável evento do cinema mundial. No ano passado, outro curta pernambucano, Muro, de Tião, foi destaque no evento e recebeu o prêmio Regard Neuf (Novo Olhar).

Eleito o melhor curta dos festivais de Brasília e Pernambuco, Superbarroco é uma obra diferente daquelas com começo, meio e fim. Sua narrativa se baseia no mistério, na não-linearidade da memória afetiva. Um filme em que sombras e luzes trabalham a favor do sonho e delírio. Cinema no nível da melhor poesia.

“Fiz este filme como um ourives faz uma joia”, disse Renata, em entrevista ao Diario. Ela contou que a produção tomou aproximadamente três anos de trabalho. Tudo começou do desejo de resgatar a arte da dublagem, cada vez mais em desuso, e a importância da cantora Dalva de Oliveira na cultura brasileira. “Pensando o filme hoje, vejo que ganhou inúmeras camadas interpretativas além destas ideias. A questão é que sempre trabalhamos com liberdade e intuição. O último tratamento tornou o roteiro uma grande sequência de associações livres”.

Boa parte da força de Superbarroco vem da performance do ator paraibano Everaldo Pontes, em interpretação premiada nos festivais acima citados. No fim de semana passado, após a cerimônia de premiação do Cine PE, ele disse à reportagem do Viver que se sente corresponsável pelo filme, pois ele se definiu após uma conversa que teve com o produtor Sérgio Oliveira, marido de Renata. “Estávamos rodando Árido movie, e falei para Sérgio que existe na Paraíba um fã-clube de Dalva de Oliveira, do qual faço parte desde os anos 70″, lembrou o ator, que deve integrar o elenco de Transeunte, próximo filme de Eryk Rocha.

Outro ponto decisivo do curta está no aspecto fantasmagórico da fotografia, a cargo de Pedro Urano, construída a partir de cenários e objetos banhados pela projeção de imagens de arquivo e do próprio ator, que termina por contracenar com ele mesmo. “Não poderia ter a máquina ilusionista do cinema, com suas grandes salas e telas de projeção, e não tirar proveito disto. Quis lembrar que o cinema é, em essência, o passado e a ilusão, e convidei o público a entrar conscientemente nisto”, explica a diretora.

Ela considera Superbarroco a consequência de suas experiências de infância, afetivas e profissionais – ela tem formação em teatro, e construiu carreira como diretora de arte, onde foi premiada por Feliz Natal, de Selton Mello, e Baixio das bestas, de Cláudio Assis, ambos no Festcine – Goiânia, e por Amarelo manga, de Cláudio Assis (Cine Ceará). Outros filmes no currículo são A festa da menina morta, de Matheus Nachtergaele, e Árido movie, de Lírio Ferreira. Em fase de finalização estão Histórias de amor duram apenas 90 minutos (RJ), de Paulo Halm, e Hotel Atlântico (SP), de Suzana Amaral.

Memória parece ser a palavra chave para a compreensão do filme. O casarão onde foi rodado é, há duzentos anos, a casa grande da família de Renata. “Lá ouvi muitas histórias de meus antepassados”.

Quanto às motivações do personagem, embriagado de si, ela prefere deixar a cargo de quem assiste. “Quando estávamos em processo de construção do personagem, fiz questão de deixar lacunas de compreensão. Estudei um pouco de Butô. Nesta dança japonesa, o corpo é esvaziado de referências culturais e se entrega a arquétipos da mente”, revelou Renata, que já articula os primeiros movimentos para viabilizar Vago, projeto de longa-metragem anterior a Superbarroco. A viagem a Cannes pode ser um ótimo trampolim.

*publicado no Diario de Pernambuco