Lost Girls – Volume 2: as terras do nunca

Estas são as poucas cenas “censura livre” contidas no segundo volume da trilogia em quadrinhos Lost Girls (Devir Livraria, 112 páginas, R$ 65), de Alan Moore e Melinda Gebbie. Nele, as meninas crescidas Alice, Dorothy e Wendy continuam explorando a amizade íntima que construíram, enquanto narram umas às outras as aventuras sexuais que as lançaram, quando adolescentes, aos fantasiosos universos do País das Maravilhas, Oz e Terra do Nunca.

Tudo se passa em 1913, nas dependências de um luxuoso hotel austríaco. Sob a tutela de Alice, a mais experiente do trio, elas conduzem o leitor a um mundo de prazeres sensoriais e perceptivos.

Em entrevista ao jornalista Diego Assis, Alan Moore diz que Lost Girls só foi possível graças à extraordinária relação de intimidade desenvolvida com sua companheira, a desenhista Melinda Gebbie, que permitiu a ambos expressar suas mais profundas fantasias sexuais.

Ele ainda explica que, apesar de não ter a intenção de chocar ninguém com o livro, ele se coloca contra a hipocrisia ocidental de reprimir o sexo no dia a dia, ao mesmo tempo em que o torna objeto de lucro de uma indústria cultural de bens de consumo.

As terras do nunca está ainda mais picante, poético e exuberante do que o primeiro livro, Meninas crescidas. Aqui, entende-se pelo viés psicanalizante, quem é o gato sorridente de Alice e o Capitão Gancho, um senhor pedófilo que estragava as brincadeiras de Peter Pan, Sininho e Wendy.

Lost Girls, a HQ que devolveu à pornografia ao estado da arte.

Clássicos infantis em versão para adultos

Alan Moore e Melinda Gebbie: união amorosa e trabalho de qualidade

 

Alice, Wendy e Dorothy, as meninas dos clássicos infanto-juvenis “No País das Maravilhas”, “Peter Pan”, e “O Mágico de Oz”, já tiveram suas aventuras contadas inúmeras vezes. Mas nunca assim, tão apimentadas quanto no álbum em quadrinhos “Lost Girls – Meninas crescidas”, de Alan Moore e Melinda Gebbie, que acaba de ser lançado no Brasil. Este livro, somente para adultos, é o primeiro de três volumes que compõem uma das mais belas e provocantes histórias em quadrinhos já feitas.

A história se situa no ano de 1913, quando as personagens, já adultas, se encontram num luxuoso hotel austríaco. Lá, confidenciam detalhadamente suas experiências sexuais. O projeto levou quase 20 anos para ficar pronto e, durante o processo, os dois artistas iniciaram um relacionamento amoroso que dura até hoje.

Naquele tempo, Moore começava a se destacar por suas narrativas iconoclastas e terrivelmente bem construídas, como “Watchmen”, em que super-heróis são usados na guerra fria, e logo depois “V de Vingança”, a distopia orwelliana que dinamitou o discurso da democracia ocidental. Em “Lost Girls”, a subversão está em mostrar sexo explícito com a mesma naturalidade e bom gosto presentes nos escritos originais.

O projeto começou quando Moore entendeu os vôos mágicos de Peter Pan e Wendy como uma metáfora para as descobertas sexuais da adolescência. Sob este ponto de vista legitimamente freudiano, situações como o apressado Coelho Branco que leva Alice ao País das Maravilhas, e Dorothy a dar piruetas dentro do furacão, ganham dimensões insuspeitas até então.

A estética muda de acordo com cada capítulo, seguindo padrões de uma exaustiva pesquisa do casal sobre a pornografia feita na era vitoriana e na Belle Époque, “muito mais humana e centrada no prazer” do que a atual, “quase toda fotográfica”, disse o escritor ao periódico eletrônico Sci Fi Weekly, na ocasião do lançamento.

Ainda na entrevista, ele afirmou que o sexo tem sido sub-representado na literatura. “Há gêneros dedicados a todos os outros campos da experiência humana – até os mais rarefeitos como o mundo dos detetives, astronautas ou caubóis. Já a pornografia, o único gênero em que o sexo pode ser discutido abertamente, não tem reputação alguma, é desagradável, de baixo nível, e consumida às escondidas”.

Na contra-corrente do sexo tosco e perverso mostrado nas “Tijuana Bibles” dos anos 30 e 40, e das sacanas montagens digitais com bichinhos fofinhos que circulam na internet, cada quadro de “Lost Girls” é marcado por muito requinte e delicadeza. Um produto que eleva este gênero tão desqualificado ao nível da mais pura e transcendente arte.

Serviço
Lost Girls – Livro Um: Meninas Crescidas (Devir Livraria)
Quanto: R$ 65 (112 páginas)