Diário de berlim – terça-feira (dia 6)

Um dia e tanto o de ontem, na Berlinale. Em curva ascendente, a mostra oficial apresentou três grandes filmes. O mais cotado para o Urso de Ouro é o iraniano Nader e Simin, a separação (Jodaeiye Nader az Simin). Aplaudido na sessão para a imprensa e também na coletiva, Asghar Farhadi recebeu o Urso de Prata de 2009 por dirigir À procura de Elly (exibido no Recife ano passado, no Cine Rosa e Silva).

Agora, Farhadi pode receber o prêmio máximo com a história de uma mulher que tenta o divórcio para dar à filha uma vida melhor em outro país. O marido quer ir junto, mas não pode porque o pai está doente. Sem julgamentos, a trama vai se tornando um pouco mais relativa e complexa do que isso. Além do mérito do filme, um Urso de Ouro para um filme iraniano só reforçaria o intento da Berlinale em denunciar a situação do conterrâneo ausente Jafar Pnahi, membro de honra do júri.

Outro sério concorrente à estatueta é o húngaro O cavalo de Turin (A torinói ló), de Béla Tarr. O título remete a episódio vivido por Nietzsche, que no fim da vida protegeu um cavalo castigado pelo cocheiro. O filme é um rigoroso exercício em preto-e-branco sobre um velho fazendeiro e sua ajudante (ou seria filha?) que, como num sertão às avessas, tentam deixar a cabana de madeira onde vivem castigados pelo inverno. O filme traduz com mérito o niilismo desesperancoso do filósofo alemão. Nada pode mudar o mundo cinza, frio, áspero. E isso não é bom, nem ruim.

A estrutura episódica, quase sem diálogos (cinema é a arte do silêncio, já escreveu Jean-Claude Carriére), é narrada por imagens de beleza fantasmagórica. As cenas em que o cavalo aparece são assombrosas. Ele magnetiza a câmera, que o filme de baixo para cima, o que confere majestade ao animal. O som do vento é onipresente. Ele levanta as folhas secas para o alto. A música, reincidente e hipnótica, completa a construção. Deixar se levar por ela é a chave do
filme.

Também em competição, o norte-americano O futuro (The future) pousou como uma nave alienígena na Berlinale. A responsável, Miranda July, assumiu a direção, roteiro e o papel principal, uma frágil e vacilante mulher de 35 anos (os indies estão ficando mais velhos), que como o marido, procura um sentido para uma vida vazia. A trilha de Jon Brion, conversas com a Lua e um gato que narra a história como um filme de terror levam a crer que, quando querem, americanos podem ser bastante estranhos.