Da palavra à imagem

O escritor paulista Marçal Aquino está no Recife. O motivo é dos melhores, uma conversa sobre cinema e literatura. Quem promove é a 2ª Mostra Sesc de Literatura Contemporânea. O evento será hoje, às 19h, no salão de eventos do Sesc Santa Rita, com entrada franca. Autor de 13 livros e dezenas de roteiros para cinema e TV, Marçal esteve na cidade pela última vez em 2009, a convite da Bienal do Livro. Agora volta para tratar de questões relativas à adaptação da palavra à imagem. Entre os escritores brasileiros, é o mais tarimbado no assunto. E um dos poucos que adaptam o próprio trabalho para o cinema.

Seu currículo inclui os roteiros de todos os filmes de Beto Brant (Os matadores, Ação entre amigos, O invasor, Crime delicado e o recente Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios), além de Nina e O cheiro do ralo, de Heitor Dhalia. Para a TV, é responsável (com Fernando Bonassi) pelo seriado global Força-tarefa. A parceria deu certo. Já preparam outra série policial, que estreia ano que vem.

Formado em jornalismo – daí a familiaridade com o mundo cão e situações limite, Marçal não vê conflito entre as atividades. Diz que sua prioridade sempre foi a literatura. “É a minha casa. Me preparei para isso a vida inteira, é efetivamente o que gosto de fazer. Os roteiros são meu ganha-pão. Não fosse isso, estaria trabalhando em alguma redação”.

Marçal diz que, a não ser como espectador, nunca quis nada com o cinema. Entrou por acaso. “Em matéria de atividade economicamente inviável, já basta a literatura”, brinca. “Enquanto Beto filmava Os matadores, encontraram dificuldade na adaptação e eu disse o que faria se fosse o roteirista. Não tinha experiência nenhuma, só um curso na faculdade”.

A sintonia com Beto Brant, de quem não se diz roteirista, mas “parceiro de aventuras cinematográficas”, vem de um pouco antes. “Ele quis adaptar um livro meu. Não deu certo, mas nos aproximamos e estabelecemos uma relação de amizade. Ele é muito afetado pela literatura, todos os filmes dele têm base literária. Meu trabalho é criar condições para que ele realize o seu trabalho”.

Como cinéfilo, usa o pouco tempo livre para assistir à produção sul-coreana. “No momento, na minha opinião, ninguém faz cinema como eles”. Não são violentos demais? “Não tanto quanto Sam Peckimpah (Meu ódio será tua herança) ou Gaspar Noé (Irreversível). O que me atrai neles é a próximidade à história em quadrinhos”.

E é justamente pelos quadrinhos, sua primeira paixão, que se explica a força imagética da prosa de Marçal. “Dizem que minha ‘literatura visual’ tem a ver com o trabalho como roteirista, mas meu primeiro impulso artístico vem dos quadrinhos, que é o cinema estático. Já cheguei a desenhar, mas hoje sou só leitor. Meu trabalho é a palavra”.

Atualmente, além de trabalhar para a Globo, o escritor se dedica ao próximo livro, Como se o mundo fosse um bom lugar. Sobre ele, nem uma palavra. “Decidi não falar sobre o que está sendo feito. Não é superstição. Vou descobrindo o livro na medida em que escrevo. Quanto mais certezas eu tiver, pior”.

(Diario de Pernambuco, 26/11/2011)

Versos para as insubmissas filhas de Lilith

Nas últimas décadas, o mito de Lilith tem servido de inspiração tanto para artistas quanto para militantes da causa feminista. Insubmissa e rebelde, esta personagem bíblica perdeu o status de primeira mulher, feita por Deus com o mesmo barro de Adão, para amargar por séculos o papel de demônio. Identidade que tem sido contestada por mulheres na busca de emancipação e por artistas que evocam a sensualidade e erotismo de Lilith em suas obras. De forma particular, estas duas dimensões estão presentes em As filhas de Lilith, novo livro de poesias de Cida Pedrosa. A obra será lançada hoje, às 19h, no auditório da Livraria Cultura. Além da sessão de autógrafos, o evento prevê recital com o grupo Vozes Femininas e com o artista Biagio Pecorelli.

Em conversa com o Diario, a escritora revela que buscou em Lilith o antídoto para a síndrome de culpa que recai nos ombros femininos desde que Eva foi acusada como responsável pelo paraíso perdido. “Acho que nós, mulheres, carregamos essa culpa, e isso é uma crueldade sem fim”. Os dois anos de “gestação” renderam 26 poemas com figuras femininas, uma para cada letra do alfabeto. De Angélica a Zenaide, há espaço para pessoas e cenas comuns ao cotidiano, vertidas para o suporte poético de forma ousada e perspicaz, e descritas pela criadora como “mulheres pós-tudo, e histórias do que fizeram de nós”.

A falta de pudor de alguns poemas beira o pornográfico, pois abre mão da metáfora para descrever atos e situações sexuais. Porém, como explica Cida, a obra não se restringe ao erotismo: também trata de lutas, dor e morte. No “verbete” Sihem, ela recria a saga real de uma mulher-bomba, que veste burca e, ao contrário do que prevê o profeta, quando chegar ao paraíso, não terá 40 virgens à espera. Outro dois personagens não-fictícios serviram aos propósitos da escritora: Joanita, uma das mães da Praça de Maio, e Khady, menina senegalesa que teve o clitóris mutilado.

A estrutura do poema narrativo, aquele que conta uma história, encontra explicação na origem da autora, nascida na área rural de Bodocó, sertão do Araripe. “A gente não tinha televisão, e meu pai, Francisco de Assis, era um grande contador de histórias. Outro era o marceneiro Zé Pedro. As histórias deles eram mais do que cinema”.

As filhas de Lilith chama atenção não somente pelo conteúdo, mas pelo produto em si. Desde quando submeteu o livro ao edital do Funcultura, ela tinha em mente convidar a artista plástica Tereza Costa Rego, que disponibilizou 29 obras para o projeto. O feliz “casamento” entre texto e imagem é mérito do projeto gráfico de Jaíne Cintra, designer da equipe de arte do Diario. “O livro deixou de ser meu. É de nós três”, diz Cida.

Com o lançamento, Cida comemora 30 anos de carreira, e o início de uma nova fase. Entre a advocacia (na qual atuou na área de direitos humanos) e a vida literária, iniciada com o Movimento dos Escritores Independentes, de 1982 para cá, publicou quatro livros: Restos do fim, O cavaleiro da epifania, Cântaro e Gume. Todos sob a marca da independênciareconhecível nas palavras “edição do autor”. Desta vez, seu trabalho traz na capa o selo da Editora Caliban, sinônimo de tratamento gráfico diferenciado e distribuição de abrangência nacional.

“Este livro é um ritual de passagem”, reflete Cida, que a partir de agora se dedicará ao universo da prosa, a começar por um livro de contos. Isso após terminar a agenda de lançamentos, que inclui as cidades de Garanhuns (16/06), Bodocó (23/06), Petrolina (25/06) e Paraty (RJ), onde participa da OFF Flip.

Serviço
Lançamento do livro As filhas de Lilith, de Cida Pedrosa
Onde: Auditório da Livraria Cultura (Paço Alfândega – Recife Antigo)
Quando: Hoje, às 19h
Informações: 2102-4033

* publicado no Diario de Pernambuco
Entrada franca

Espaço mínimo amplia conceito de livro

Cinquenta microcontos com até cinquenta letras cada. Este foi o limite auto-imposto por Wilson Freire para compor sua nova obra, feita para comemorar a emblemática marca dos cinquenta “cumpleaños”.

Hoje, às 17h50, ele autografa a coletânea Cinquentinha no bar Casa da Moeda. A programação ainda conta com recital poético e projeção de filmes assinada pela VJ Mary Gatis. Durante o evento, Cinquentinha estará à venda por R$ 10. A entrada é franca.

Nos últimos anos, esse sertanejo de São José do Egito divide seu tempo entre a medicina e a arte multimídia, onde tem atuado com distinção no front literário, musical e cinematográfico, com destaque para sua parceria com Antonio Nóbrega, o cineasta Heitor Dhalia e na direção do curta Miró: preto, pobre, poeta e periférico (2008).

Desta vez, Freire traz à tona uma publicação um provocativa, pois força os limites do conceito “livro” ao fazer uso do formato de uma cédula rasurada de R$ 5 como suporte para literatura.Diz que, apesar de Cinquentinha não cumprir os critérios da ABNT para definir um livro, ele o considera como tal.

“O formato faz parte da mensagem. Precisamos rever essas regras ultrapassadas, que não dão conta da liberdade de criação dos dias atuais”, diz o escritor, que não está só nessa empreitada. Como ilustração, ele cita Dois palitos, interessante livro-caixinha de fósforo com microcontos escritos pelo paranaense Samir Mesquita, e revela qual será o próximo passo: publicar seus textos em um minicalendário descartável.

Uma ousadia estética que desemboca no próprio texto. Os “microcontos” de Freire tão curtos que levantam dúvida se pertencem ao reino da prosa ou da poesia zen – o haicai. O autor discorda: “um microconto é narrativa passageira, e que diz logo a que veio. É de uma rapidez que faz parte da vida moderna”. Daí temas “urbanos” como violência, miséria e hábitos noturnos serem tratados com humor ácido e por vezes nonsense, algo próximo de outra narrativa baseada na brevidade: as tiras em quadrinhos.

Freire diz que começou a desenvolver o projeto há alguns anos, quando foi convidado por Marcelino Freire para participar do livro Os 100 menores contos do século (Ateliê Editorial), do qual participaram Dalton Trevisan, Manoel de Barros, Millôr Fernandes, entre outros. A proximidade com o cinquentenário de vida foi o incentivo que faltava para realizar este trabalho solo, que encontra no prefácio, assinado pelo mesmo Marcelino, o momento mais abundante – afinal, são cerca de dez linhas.

Serviço
Lançamento de Cinquentinha, de Wilson Freire
Quando: Hoje, às 17h50
Onde: Casa da Moeda (Rua da Moeda, 150, Bairro do Recife)
Informações: 8722-6027
Quanto: Entrada franca

Quatro microcontos de Cinquentinha

Lei seca
Vampiro nos tempos do HIV mudou de hábitos deixou de beber

Overdose
Tu és pó e ao pó voltarás

Lei da selva
O tamanduá amanheceu com a boca cheia de formigas

Assalto à barbearia
Amarraram o barbeiro com o fio da navalha

publicado no Diario de Pernambuco

Poesia urbana em cordel

Fernanda Jardim, Jailson Marroquim, José Terra, Juareiz Correya, Odmar Braga, Rogério Generoso e Sílvio Hansen são sete poetas que não se espelham na literatura popular nordestina, mas adotaram o formato clássico das publicações de cordel para veicular seu trabalho. Criticando os encontros literários e recitais da cidade, eles lançam hoje, às 18h, no Gabinete Português de Leitura, o primeiro número da coleção Movipoesia em Cordel.

Apesar do suporte ser o mesmo da literatura de cordel, Juareiz Correya diz que o conteúdo em nada se parece com esse gênero da poesia popular. “Não fazemos literatura de cordel. Para isso existem os cordelistas. Nossa literatura é urbana”, argumenta.

Cada livreto será vendido a R$ 2. O baixo custo foi um dos motivos do grupo ter adotado o formato folheto. “Ele funciona em termos econômicos, pois barateia a produção. Queremos tornar nossa poesia acessível, de uma forma simples”, explica Correya.

Esta será a estreia do Movipoesia na capital pernambucana. Com apenas seis meses de atividade, o grupo marcou presença no 1º Festival Lítero-cultural de João Alfredo, 3º Festival de Literatura de Garanhuns, e na Fliporto 2008, em Porto de Galinhas. Ao longo de 2009, cada autor do coletivo será publicado individualmente pela coleção, o que renderá um volume único a ser lançado no fim de 2009. (A.D.)

Serviço
Lançamento da coletânea Movipoesia em Cordel
Onde: Gabinete Português de Leitura (Rua do Imperador, 290 – Santo Antonio)
Quando: Hoje, às 18h
Quanto: Entrada franca
Informações: 3224-2002

Fundarpe concede autonomia à literatura


Criação de uma pasta específica para o setor, antes atrelado às artes plásticas/gráficas, sinaliza nova disposição do governo com as letras
André Dib // Especial Para o Diario

A notícia ainda não foi divulgada oficialmente, mas desde outubro Pernambuco conta com uma coordenação específica para a literatura. O escritor e jornalista Samarone Lima foi nomeado para a pasta, até então conjugada com artes plásticas e gráficas, sob responsabilidade do artista plástico Félix Farfan. “Muitas pessoas ainda não estão sabendo porque foi uma entrada mansa. Antes de convocar o setor, precisei de um tempo para conhecer melhor a nova casa”, disse Samarone à reportagem do Diario.

A missão do novo coordenador será desenvolver no âmbito da literatura as diretrizes estabelecidas pela política cultural da gestão estadual. Para ele, o desmembramento para uma coordenadoria exclusiva foi um movimento natural por parte da Fundarpe. “O objetivo é colocar a literatura na pauta da sociedade. O estado tem tradição de grandes vôos na literatura, e como não havia uma interlocução específica, esse trabalho estava sendo tocado com certa dificuldade”.

Nascidono Crato, interior do Ceará, Samarone Lima se mudou em 1987 para o Recife, onde se formou jornalista pela Universidade Católica. Na imprensa, foi repórter do Diario de Pernambuco e da revista Veja, entre outros veículos. Como escritor, sua trajetória inclui passagem por pequenas e grandes editoras, onde publicou quatro livros. Outros dois estão em gestação: Adiós Nonino, sobre uma visita recente a Cuba; outro, baseado nas viagens que fez Brasil afora com o espetáculo Nau, de Ariano Suassuna.

Durante as viagens com a trupe de Suassuna, Samarone constatou que a presença de bibliotecas e livrarias nas cidades do interior é praticamente nula. Por isso, um primeiro passo no sentido de interiorizar a ação da coordenadoria será incluir a dimensão literária no circuito Pernambuco Nação Cultural. Enquanto isso, parcerias estão sendo estabelecidas com a UFPE, Companhia Editora de Pernambuco e da sociedade civil, através de ONGs como o Centro Luiz Freire, Pontos de Cultura e bibliotecas comunitárias. “Temos acesso ao registro dos fóruns realizados nas 12 regiões de Pernambuco, e acredito que podemos fazer muito articulando projetos isolados e promovendo encontros estaduais”.

“Sou uma pessoa apaixonada pela literatura. O desafio é transformar isso em políticas públicas, articular parceiros, e pensar projetos”, avalia Samarone. Para chegar a tanto, seu maior trunfo está na valiosa experiência de educador, desenvolvida nas Oficinas da Palavra com jovens do projeto Oi Kabum!. Nada mais emblemático do que o fato dos dois integrantes da nova equipe, Gabriela Alves Lima, 22 anos, e Aldemir Félix, 21 anos, virem justamente desse contexto. “Lá, lidando com alunos que antes odiavam livros, eu vi como a literatura pode transformar a vida das pessoas”, conta o escritor, que pretende interagir em bairros com histórico de violência, como o Santo Amaro, em parceria com o Pacto pela Vida. “Um jovem com um livro de poesia na bolsa está mais protegido”, acredita.

Apesar do orçamento para 2009 não ter sido revelado, Samarone adianta algunsplanos, como a criação dos agentes de leitura (nos mesmos moldes dos agentes de saúde) e do selo Amigo do Livro, que premiará os melhores projetos de leitura com incentivo financeiro para aquisição de acervo. “Se conseguirmos articular esses primeiros projetos, começaremos a respirar literatura e pensar em passos maiores”.

A publicação de livros, que talvez seja a demanda mais forte a ser enfrentada pela coordenadoria, terá regras a serem estabelecidas por um conselho editorial, ainda não definido. “É a maneira mais democrática de não privilegiar ninguém, pois diariamente chegam propostas de todos os tipos”, explica Samarone que, enquanto não conta com um espaço definitivo nos prédios da Fundarpe, informa o email para os primeiros contatos: literatura.fundarpe@gmail.com .

Olavo Bilac e companhia em HQs da Domínio Público

Renato L // Diario
renatol@diariodepernambuco.com.br

O projeto Domínio público – literatura em quadrinhos, idealizado pelos pernambucanos João Lin e Mascaro (editor de arte do Diario e do Aqui PE), colocou um desafio instigante diante de um grupo de jornalistas e quadrinistas: adaptar para o universo dos comics uma série de narrativas de autores brasileiros canônicos como Machado de Assis, Augusto dos Anjos, Olavo Bilac e Lima Barreto. Lançado de forma independente em 2006, o primeiro volume retorna às prateleiras pela editora DCL, com outro formato gráfico, que reforça a riqueza narrativa e visual das histórias selecionadas.

João Lin e Mascaro aproveitam no novo projeto a experiência adquirida com a revista Ragú, produzida por eles, que já está na sétima edição – um feito e tanto em um mercado rarefeito para os quadrinhos como o nordestino. O título da nova empreitada dá uma pista dos objetivos da dupla: driblar as restrições cada vez mais contestadas das leis de direito autoral e divulgar a obra de autores muito citados, mas, às vezes, pouco lidos. “Sempre acreditamos no potencial desse produto para sair do gueto underground. O acordo firmado com a DCL nos dá uma distribuição nacional mais eficiente”, afirma Mascaro.

A entrada em cena da editora paulista tem uma explicação: o governo federal incorporou os quadrinhos ao Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE), um projeto instituído em 1997 para facilitar o acesso de professores e alunos aos bens culturais. Esse mercado estatal, cobiçado por toda a indústria do livro brasileira, possibilita que uma obra como Domínio público alcance uma tiragem inicial em torno dos 15 mil exemplares. Agora, a estudantada – mas não só eles, claro – pode conhecer com mais facilidade as adaptações para quadrinhos de contos como O homem que sabia javanês (Lima Barreto), A cartomante (Machado de Assis) e O soldado Jacob (Medeiros e Albuquerque).

“Trabalhar com material desses nomes canônicos foi uma maneira de contornar a escassez de bons roteiros dos quadrinhos nacionais”, afirma Mascaro. Para escolher as duplas de adaptadores e ilustradores, ele e João Lin levaram em conta a compatibilidade dos potenciais convidados com o estilo dos contos originais. “Em alguns casos, a adaptação foi feita antes da quadrinização. Em outros, se deu exatamente o contrário. As duplas tiveram autonomia para decidir sua maneira de funcionar”, conta Mascaro. Vários jornalistas pernambucanos – ou radicados no Estado – estão entre os escolhidos pelos idealizadores, como Júlio Cavani e André Dib, ambos repórteres do Viver, e de Lydia Barros,ex-editora do Viver.

O segundo volume da série Domínio público, reunindo autores estrangeiros como Bram Stoker e Esopo, também foi publicado de forma independente e pode ser encontrado nas livrarias. Por enquanto, a DCL ainda não confirma seu relançamento nacional. Mas Lin e Mascaro não perdem tempo: eles planejam, agora, um terceiro volume, dedicado ao realismo fantástico.

Festival Recifense de Literatura terá mesa redonda sobre quadrinhos e literatura

Domínio Público: um bom exemplo de literatura em quadrinhos

O 5º Festival Recifense de Literatura incluiu na programação desta edição a mesa redonda “Quadrinização do Texto Literário“. Ela está marcada para o dia 17 de agosto, às 19h, no auditório da Livraria Cultura (Paço Alfândega – Recife Antigo).

Participam do evento os artistas Mascaro e João Lin , que ao lado do jornalista Mário Hélio, formam o núcleo editor do projeto de literatura em quadrinhos Domínio Público, e Ester Calland Rosa, Diretora Geral de Ensino e Formação Docente da Secretaria de Educação, Esporte e Lazer do Recife.

Palestra sobre literatura adaptada em quadrinhos no Recife

Saiu no Diario de Pernambuco de hoje:

PALESTRA – Mascaro e Lin falam sobre Hq

Experimentação nas artes gráficas é o tema das palestras que acontecem hoje, às 19h30, na Escola Oi Kabum (Rua do Bom Jesus, 147, Bairro do Recife). Na ocasião, os quadrinistas Christiano Mascaro e João Lin, responsáveis pelos livros do projeto Domínio Público e pela revista Ragú, discutem quadrinização da literatura, e Renato Alarcão fala sobre Diários gráficos. A entrada é gratuita.

Matéria sobre "O Alienista" (de Machado de Assis) em quadrinhos, na Folha de Pernambuco de hoje

Na Folha de Pernambuco de hoje saiu uma resenha minha sobre mais uma adaptação da literatura para os quadrinhos: o conto O Alienista, escrito por Machado de Assis em 1881. Lançada no começo deste mês, a recriação em HQ é assinada por Fábio Moon e Gabriel Bá, e é o primeiro volume da série “Grandes Clássicos em Graphic Novel”, publicada pela Editora Agir (grupo Ediouro).

Para ler a matéria, é só clicar aqui.

"O Alienista" em quadrinhos: um bom exemplo de adaptação

Os irmãos Fábio Moon e Gabriel Bá fizeram uma bela versão em quadrinhos de “O Alienista” (R$39,90), de Machado de Assis. Editado pela Agir, recentemente adquirida pela Ediouro, o livro está sendo anunciado como o primeiro de uma série a adaptar clássicos da literatura brasileira. Que venham mais.

Longe da chatice das adaptações convencionais, os autores acertaram a mão. Não mutilaram o texto para caber em poucos quadros (tiveram espaço para isso, são 72 páginas), fizeram bom uso da linguagem dos quadrinhos: sequências em silêncio, cores em tons de sépia, uso de metáforas e um traço que caracteriza com pompa e nobreza os personagens deste conto passado no fim do século 19.

Talvez por isso a palavra “quadrinhos” está ausente da capa. Os editores preferiram usar o eloqëente “Grandes clássicos em graphic novel“. Não importa o nome, a obra é um convite irresistível a conhecer o alienista original.

Outro trabalho dos irmãos desenhistas, “De:TALES” (Dark Horse), acaba de ser indicado ao Eisner Awards, o “Oscar” dos quadrinhos, na categoria “Melhor edição americana para material estrangeiro”.

Literatura em quadrinhos: Marcatti revela como adaptou Eça de Queiroz

Assim como muitos, fui apresentado ao trabalho do grande Marcatti nos idos de 1986, folheando a revista Chiclete Com Banana. Diferente da acidez de Angeli e do pastelão de Glauco, suas HQs faziam comédia de humor negro com todo tipo de perversão sexual e escatológica. Ou seja, com treze anos, aprendi que uma história em quadrinhos pode ser uma coisa bem suja.

Corta pra 2006. Marcatti surpreende ao lançar “Mariposa” (pela Conrad), história longa e trágica de um triângulo amoroso, em formato livro, capa e papel especial. Bem diferente do papel jornal da chiclete ou da revista em quadrinhos que lançou nos anos 90, Fráuzio. Até agora, foi o melhor tratamento dado a um trabalho seu.

Digo até agora porque a Conrad está rodando “A Relíquia“, em que Marcatti adaptou para os quadrinhos o romance do escritor português Eça de Queiroz (1845-1900). O resultado são 186 páginas de quadrinhos, produzidas em 17 meses de trabalho. O lançamento será ainda neste semestre.


Pelos desenhos, dá pra sacar que vem por aí material de primeira qualidade.

Na entrevista abaixo, Marcatti falou para o Quadro Mágico sobre o processo de recriação de “A Relíquia”, e suas impressões sobre quadrinhos e literatura. Ao que parece, ele deu um tempo na escatologia explícita para se dedicar à obra de Eça de Queiroz, de acordo com Marcatti, uma corrosiva crítica à burguesia católica do século 19.

ENTREVISTA // MARCATTI
“Foi a mais longa e trabalhosa HQ que já fiz”

Qual o motivo da escolha de “A Relíquia”?

Foi sugestão da Conrad a adaptação da obra de Eça de Queiroz através do meu trabalho. O Alexandre Linares enviou-me uma cópia de “A Relíquia” deixando-me completamente à vontade para fazer da forma que eu quisesse. Essa liberdade permitiu que eu tomasse todas as decisões a respeito. Mesmo assim, acabei por optar em fazer a adaptação buscando o máximo de fidelidade. Eu nunca havia lido qualquer livro do Eça e fiquei muito impressionado com sua força e, em muitos casos, com a ousadia com que ele abordou a burguesia católica do século 19!

Fale um pouco sobre o método adotado na “tradução” para a linguagem dos quadrinhos. Foi algo pré-estabelecido, ou mudou no desenrolar do trabalho?

De início, fiquei preocupado. Uma obra clássica com longos trechos que, apesar de contundentes e fascinantes, pouco tinha de cenas e movimentos que dessem fluência na linguagem das HQs. Minha solução foi utilizar e embutir essas magníficas observações do Eça de Queiroz dentro das cenas e das condutas das personagens. Fiz com que suas atitudes e comportamentos tentassem traduzir a carga corrosiva das críticas do autor. Foi tudo construído na fase de desenvolvimento do roteiro. Decidi que só começaria a desenhar quando eu tivesse definido completamente a mecânica narrativa.

Pensar um romance em imagens deve pedir muita imaginação e pesquisa. Como foi o seu processo de criação?

A maior parte da pesquisa que fiz foi em relação a arquitetura e o vestuário comuns em Portugal do século 19. Transformar o livro em imagens é que foi mais trabalhoso. Primeiro anotei somente as cenas do livro. Em separado, fiz um resumo conceitual do livro. Um resumo bem pequeno, quase uma resenha. Apenas para registrar o foco geral do livro. Como se eu tivesse perguntado diretamente ao Eça: “Que tipo de reação você esperava das pessoas que leram essa obra?”. Infelizmente, coube a mim dar a resposta. Mas foi justamente esse ponto de vista que alicerçou e orientou toda a recriação das cenas. Gostei bastante dessa experiência e fiz com tanto prazer que nem parece que levei 17 meses nessa adaptação.

Deve ter sido o teu quadrinho mais trabalhoso, não?

De fato, foi a mais longa e trabalhosa HQ que já fiz. Mas, eu não sinto isso. Quando olho as datas que coloquei em cada uma das páginas originais, eu fico surpreso. Tenho realmente a sensação que fiz tudo em pouco mais de 2 meses. Foi uma lição! O Eça é uma escola. Acho que, se não fosse por esse trabalho, eu precisaria fazer mais umas 10 histórias para aprender tudo o que aprendi fazendo “A Relíquia”.

Na sua opinião, os quadrinhos compreendem um gênero literário?

Sempre pensei em HQ como forma literária. Para mim, não faz nenhum sentido a distinção entre “literatura e quadrinhos”. Soa-me estranha a expressão. Acredito que a forma pouco respeitosa como os norte-americanos enxergam a linguagem das HQs, somada a indiscutível influência cultural que exercem sobre o resto do planeta, contribuiu muito para essa distinção. Enquanto na Europa muios autores de HQ são reverenciados como gênios literários, a maioria dos grandes nomes da HQ norte-americana têm esse reconhecimento graças muito mais pelo sucesso comercial.

Tal como subdividir em prosa, verso, conto, novela etc, HQ é uma forma de exercer literatura. Caso contrário é o mesmo que fazer a distinção entre “conto e literatura”.