Durante uma conferência, o cineasta alemão Wim Wenders disse que os lugares têm histórias próprias para contar. “Os lugares têm memória. Daqui a milhares de anos, quando ninguém lembrar de nós, eles estarão ali. E se lembrarão de nós”. Além de remeter ao conceito de filmes como “Paris, Texas” e “Asas do Desejo”, a afirmação de Wenders se aplica perfeitamente ao novo filme de Mariana Lacerda, “A Vida Noturna das Igrejas de Olinda”. Selecionado para a competição da 5ª Janela Internacional de Cinema do Recife, o curta-metragem se apropria de relatos históricos sobre a arquitetura da cidade-patrimônio para construir uma narrativa fantástica, por vezes sobrenatural.
Pernambucana radicada em São Paulo, Mariana desenvolveu carreira como jornalista e estreou no cinema em 2008 com “Menino-Aranha”, documentário que organiza depoimentos enquanto simula o ponto de vista do adolescente que escalava edifícios de Boa Viagem. No novo trabalho, a diretora promove um diálogo quase silencioso entre as igrejas de Olinda, à procura de fantasmas em suas escadarias e espelhos, de onde emanam narrações feitas pela própria Mariana, além de Marcelo Pedroso (que montou o curta), W.J. Solha, Emilie Lesclaux, Carlos Costa, Hilton Lacerda, Julia Morin e Jr. Black.
A câmera flutua, em busca da memória de cinco séculos. “Quando a tarde cai, acontecem coisas dentro de nós. Objetos e lugares também são tomados por esse instante”, explica a diretora. A relação com o mar é fundamental. O que aqueles blocos selados a óleo de baleia e revestidos com azulejos portugueses, têm a dizer? “As paredes falam, se você quiser ouvir. Se você chegar muito perto delas, vai sentir o cheiro do mar”, diz Mariana, dando a dica do que vem por aí.
Em breve, o curta-metragem deve ganhar uma versão em livro, com ilustrações de Clara Moreira e produção de Emilie Lesclaux. Paralelamente, Mariana desenvolve seu próximo projeto, “Pausas Silenciosas”, um documentário sobre o fotógrafo pernambucano Alcir Lacerda (1927-2012). Na abertura da 5ª Janela Internacional de Cinema do Recife, no Cinema São Luiz, um corte especial será exibido, em homenagem ao mestre, cuja foto da Avenida Agamenon Magalhães nos anos 1970 ilustra a arte do festival.
(Folha de Pernambuco, 31/10/2012)